Lúcius | 1x07: "O Anjo e o Demônio"


Uma obra de: Dolfenian Khallium

— Eu tenho percebido que a sua relação com o Lúcio é um pouco diferente... Vocês dois são bem próximos, e um costuma proteger o outro... — Diz o terapeuta batendo com a tampa da caneta sobre o sofá enquanto encara Rafael.
— Sim, nós somos amigos, é o que um amigo faria pelo outro, não é? — Ele responde rindo.
— Sim, mas... Ele faz uma pausa. — Como você se vê quando o Lúcio começar a namorar com alguém?
O garoto fica sem saber o que responder na hora. Revira seus olhos para todos os cantos. É uma pergunta simples, mas que para ele, possui uma resposta complicada.
— Eu não sei, por quê? — Pergunta.
— Não sabe...
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Rafael acorda, são quase duas horas da tarde. Um breve descanso de sua faculdade. Se levanta e veste uma roupa, antes notando seus músculos e bíceps, um resultado de longas horas na academia.
Desce as escadas sentindo um saboroso cheiro de comida vindo da cozinha. Ao chegar lá, a primeira coisa que ele vê é aquela maravilhosa lasanha sobre a mesa, seguida de um arroz bem solto, macarrão perfeito e uma salada bem verde.
Lúcio teria feito o almoço, como de costume, e deixou toda a roupa suja de gordura. O som ao fundo é de Melanie Martinez, um clima bem agradável.
— Bom dia, dorminhoco... — Diz Lúcio num tom malicioso.
— Bom dia... — Responde sorrindo ainda com preguiça. — Alguém se empolgou no almoço, não é mesmo?
— Sim, teremos visita hoje, um garoto que eu conheci a pouco tempo...
— Garoto?! — Pergunta um pouco sério, mudando sua postura.
— É... — Ele responde um pouco surpreso com a reação de Rafael. — Algum problema?
— Não... eu...
Alguém bate na porta, uma batida tímida assim como a visita. Lúcio automaticamente entra em choque, ele não esperava que o garoto chegasse tão cedo.
— Droga, como é que eu estou? — Lúcio pergunta lambendo o dedo.
— Gorduroso... — Responde.
— Aí que merda! Segura ele pra mim por um tempo. — O garoto diz correndo para o quarto para trocar de roupas.
— O que? Por que eu? — Pergunta aos berros.
— Porque não tem mais ninguém nessa casa, né?
Rafael bufa, respira fundo e vai em direção a porta, destranca a mesma e abre. Dá de cara com um garoto dono de um olhar depressivo, lindos cabelos lisos e escuros, muito belo e bem arrumado, todo de preto.
— Oi, o Lúcio mora aqui? — Pergunta João fazendo uma cara de quem não queria estar ali e foi forçado.
— Sim, sim, vamos entrando, ele está fazendo o seu ritual de troca de roupas.
Ele é bem recebido por Rafael e guiado até o sofá, aonde fica por um tempo aguardando em silêncio profundo, é como se não tivesse mais ninguém ali. Enquanto isso, Rafael disfarça ao tentar olhar para o garoto, é como se ele sentisse algo diferente.
— Cheguei. — Afina Lúcio descendo as escadas.
João se sente mais confortável ao ver o garoto feliz indo em sua direção. Ele o cumprimenta e depois é guiado até a mesa aonde é servido o almoço.
Durante todo o almoço, Lúcio tentava interagir com o garoto, mas ele mal dava corda, e Lúcio gosta disso, de toda essa timidez. Enquanto isso Rafael tentava se encaixar na conversa, já que se via excluso.
— Aí, quer ver uma coisa legal? — Pergunta Rafael retoricamente forçando um sorriso.
Ele tira de seu bolso uma cruz bem pequena, daquelas de madeira feitas para serem usadas em colares. Força o objeto contra o braço de Lúcio e solta rapidamente. A cruz instantaneamente pega fogo, deixando João um pouco assustado, mas ele já sabia que esse tipo de coisa iria acontecer caso ele começasse a sair com o filho de Lúcifer.
— Ha ha, muito engraçado, realmente foi engraçado nas primeira 274 vezes que você fez isso... — Lúcio diz com sarcasmo.
Ao chacoalhar seu braço a cruz cai no chão, e o fogo vai embora como magia. Parece não ter sentido dor alguma.
— Esse tipo de coisa é normal aqui? — João pergunta curioso.
— Você não faz ideia... — Lúcio responde.
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Amanda chega na delegacia, carrega uma bolsa com todos os documentos necessários para provar seu ponto de vista.
O delegado atende a garota pessoalmente e está disposto a ouvir toda a história. Depois de um longo tempo explicando tudo, e mostrando todas as provas das gravações das câmeras de segurança, ela se sente mais aliviada.
— Essas acusações são graves, tem certeza de que quer levar isso adiante? — Ele pergunta um pouco chocado com os vídeos.
— Sim! — Responde com firmeza.
— Ótimo, nesse caso, vamos investigar mais a fundo o caso, mas lembre-se de que mesmo que prendemos ele, o cara ainda tem o direito por lei de contratar um advogado.
— Mesmo depois de todas essas provas? — Pergunta franzindo os olhos.
— Mesmo depois de todas essas provas... — Ele repete. — Você conhece o sistema, sabe que ele é falho em alguns casos...
— Nesse caso, eu vou estar disposta a lutar contra isso.
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Lúcio e João acabaram de sair do cinema. Um ótimo filme de comédia que arrancou algumas poucas risadas de Lúcio, já João, acabou permanecendo com sua face já comum.
— Ainda bem que acabou... — Lúcio brinca.
— É o que eu vou falar quando eu morrer. — O garoto responde.
Os dois caminham até a praça de alimentação. É então que Lúcio se lembra da cena constrangedora com seu pai e Rafael. Os dois se sentam num canto um pouco longe de pessoas após fazerem o pedido.
Uma gigantesca porção de batatas fritas bem deliciosa. Lúcio encara a comida com um sorriso de orelha a orelha, já João se preocupa apenas em limpar seus óculos.
— Então, o que achou do filme? — Ele pergunta com a boca cheia.
— Ainda acho que a gente deveria ter ido assistir alguma coisa de terror... — João responde, pegando com cuidado um pouco de batata.
— É, mas não tem nenhum filme de terror no cinema...
Os dois continuam a comer. Lúcio devora toda a comida com tranquilidade enquanto João guarda uma dúvida para si mesmo que não consegue mais conter.
— Lúcio, por que você está fazendo isso? — Pergunta.
— Fazendo o que? Tá falando de desejar a morte daquela garota logo a frente que não para de me encarar?
— Não, por que você me chamou pra sair? Não sou a pessoa mais animada desse mundo.
— Com toda certeza não é... — Ele sussurra. — Eu gosto de você. — Diz rindo dando um tapa de leve no ombro do garoto.
— Só por isso? — Pergunta novamente.
— Olha que legal! Você disse duas frases em menos de um minuto! — Ele brinca. — E respondendo a sua pergunta... eu acho que sim...
— Entendi...
— Por que a pergunta?
— Fiquei com medo de como você reagiria caso eu fizesse... — Ele faz uma pausa com um pouco de vergonha.
— Fizesse isso? — Lúcio completa se aproximando do garoto.
Segura as mãos do garoto o beijando lentamente. Desliza seus dedos pelo rosto do menino que corresponde ao beijo molhado e duradouro. João beija os lábios de Lúcio com um intensidade gigantesca, enquanto isso, algumas pessoas ao redor sussurram coisas. Se dividem entre homofóbicos e pró-LGBTTQ.
Lúcio acaricia as bochechas de João, enquanto ele continua o beijo suavemente fazendo sua língua dançar na boca do garoto.
Os dois ficaram assim por um longo tempo, por mais que houvessem homofóbicos na praça de alimentação do shopping, nenhum se quer tomou atitude para começar uma discussão. É então que alguém chega cortando todo o clima.
— Lúcio? — Diz o garoto com que aparenta ter a mesma idade de Lúcio.
Os dois param de se beijar imediatamente, João até fica sem jeito, e Lúcio um pouco irritado. O garoto ao lado da mesa está de pé, usa um sobretudo de cor cinza com detalhes em cor preta. Dono de cabelos ruivos e lisos, olhos verdes, está com um lindo sorriso, bem inocente. É realmente muito bonito.
— O que foi? — Pergunta irritado. — Se for sobre o beijo, a gente tá no século XXI, cresce um pouco, o seu Deus tem mais o que fazer do que ficar condenando pessoas que se amam!
— Lúcio, não tá exagerando um pouco? — Pergunta João ao notar a atenção atraída por algumas pessoas.
— Por que toda vez que eu venho nesse lugar eu acabo me envolvendo em uma confusão? — Diz respirando fundo.
— Eu sei quem você é. — Fala o garoto cessando na hora a discussão. — Me chamo Nathanael, sou um anjo do senhor.
— Ai... que... merda... — Lúcio sussurra. — Tá bom, quem lá em cima chamou a polícia?
— Espera, você é um anjo mesmo? Como vamos acreditar em você? — Pergunta João.
— Ele está falando a verdade, eu consigo sentir... — Lúcio avisa. — Mas a pergunta é: O que você quer?
— Meu pai me enviou para ficar de olho em você, isso foi logo depois do ocorrido neste lugar. Seu pai quase matou um inocente. Meu pai é misericordioso, e está disposto a perdoar o anjo caído, mas não com essas atuais atitudes dele. — Fala calmo mantendo uma postura tranquila.
— Droga, lá vamos nós. — Faz uma pausa. — Está bem, escuta, quem quase matou foi o meu pai, eu só estou de folga aqui. Não preciso de nenhum anjo da guarda, e acho que vocês tem problemas maiores para cuidar em outros lugares.
— Um anjo e um demônio discutindo, tem como isso dar errado? — João sussurra respirando fundo.
— Não posso simplesmente ir embora, estaria desobedecendo uma ordem direta do pai. — Ele explica ainda sem perder o tom calmo da voz.
— Não é problema meu... Quanto tempo você tem que ficar aqui? E outra coisa, a casa tá cheia, não tem lugar pra você ficar, o Rafael surtaria.
— Tenho que ficar até você partir desse reino. Acho que Rafael não teria problemas caso eu fosse morar com vocês, levando em consideração de que ele já vive com um demônio.
— Uau, quase me ofendeu, mas você não entendeu? Não vai morar com a gente!
— Tá, ele vem morar comigo. — João interrompe a discussão. — Agora vamos parar com essa briga, estamos chamando atenção de outras pessoas.
Os outros dois ficam em silêncio por alguns segundos. João teria se irritado, mas não é só por isso. A resposta dele também é um pouco surpresa.
— Você tá brincando, né? Vai morar com um anjo? Credo!
— Não tenho problemas com isso, só vamos acabar com essa discussão... — João fala um pouco irritado. — Eu vou chamar um Uber para a gente.
— Eu não acredito nisso... — Lúcio sussurra balançando sua cabeça negativamente.
— Muito obrigado, João, serei muito grato a você. — O anjo responde sorrindo. — Mas o que é um Uber?
— É um transporte celestial, idiota. — Lúcio responde sem paciência.
— Nossa, eu não sabia que os humanos tinham direito a esse tipo de coisa aqui. E o que é um idiota? — Pergunta inocentemente.
— As coisas mudaram desde o século XIV. E idiota é um elogio... — Lúcio responde com sarcasmo.
— O Uber vai chegar em cinco minutos, melhor eu e ele irmos agora. — João fala bloqueando seu celular e guardando em seu bolso.
Os dois se levantam enquanto Lúcio continua a comer as batatas. Ainda tem algumas coisas para resolver no shopping.
— Tchau, então. — Lúcio fala desanimado.
João se despede dele dando um beijo curto em Lúcio. Mas ele ainda está desanimado batendo os pés no chão ansioso.
— Nos encontramos em breve, Lúcio, até mais, idiota. — Nathanael se despede inocentemente, sem perceber o poder das palavras.
— Fala sério...

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