Laços Defeituosos | 1x02 - "O Presente de Casamento"


Uma obra de: Sergio Rojas Muñoz
Adaptada por: Aashley



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FADE IN.

CENA 01. CASA DE GERMANO - QUARTO DE IGNACIO - INT. - 13:57.
Ignacio está totalmente impactado e desconcertado após escutar Diego dizê-lo que pretende ficar com a custódia total do filho que Susana terá por inseminação.
IGNACIO (boquiaberto) - Como? Você pretende trair sua melhor amiga e negá-las o filho que…?
DIEGO - Não! Não! Como pode pensar… (espantado, engole a saliva) Gatinho, não pense coisas assim. Eu jamais faria algo como isso!
IGNACIO - E então…? (levanta-se) Por que Susana iria querer inseminar artificialmente e ter um filho se depois não vai criar, se esse sempre foi o sonho dela? Não lembra que há uns meses brigamos bastante por isso?
DIEGO - Bem… Vejamos… é meio complexo, mas tenta entender. (pausa, pensativo) Cê sabe que Diana nunca quis engravidar porque segundo ela, perderia seu corpo e blá blá blá… Aliás, em segredo, te digo que na verdade Diana odeia crianças, porém Susana sonho com isso de maternidade. De tanto encher o saco e até de ameaçar com divórcio, Diana acabou aceitando meu pedido porque supostamente Susana quer experimentar o sentimento de levar uma criança na barriga, as ecografias, os desejos e tudo isso. Questões de mulheres. No entanto, ela não poderia criar.
IGNACIO - Por quê? Não entendo… É que algo não me desce nisso tudo…
DIEGO - É que Diana decidiu me ajudar e deixar a criança sob nossa custódia porque saiu um bico pra ela em outro país, então criar um filho agora seria uma coisa difícil para ambas, porque teria que sacrificar essa excelente oportunidade. Mas, claro, como te disse, Susana quer viver essa experiência de sentir o feto por nove meses e, sendo assim, me ajudaria também. Isso é segredo total. Portanto, te proíbo de falar disso na frente delas porque Diana ainda não contou a Susana que terão de viajar por algum tempo.
IGNACIO - Sério?
DIEGO - Sim, gatinho. (sorridente, desviando o olhar) Mas enfim… eu confiei em você, agora não fode. Não vai acabar com a chance que as meninas estão nos dando.
IGNACIO - É que… (não convencido) Há poucos meses Diana queria tanto ser mãe e agora aceita apenas que Susana atue como barriga de aluguel… É como se ela fosse entregar o próprio filho. Não compreendo isso, DIego. É um pouco perverso.
DIEGO - Nosso filho. Mete isso na cabeça. E aliás ninguém vai tirar delas a oportunidade de estar perto do bebê. Elas poderão ver nosso filho.
IGNACIO - Ok, mais devagar, cerebrozinho (pensativo) Essa coisa é como uma linda flor na antártica. CÊ sabe que eu sempre sinto algo estranho quando estou perto de Susana. Parece que não nos damos bem. Ela é bipolar, histérica e louca. Mas fazer algo assim, tão “frio”... é um bebê, cara. Um ser vivo que vai crescer e formar laços com ela, e o mais provável é que haja carinho.
DIEGO - A ambição, gatinho! Susana é bem favelada e quer ser grande. Vai ter dinheiro pela inseminação. Além disso, ama muito Diana e já combinaram sobre o assunto. Ponto. Cê sabe que Susana sempre olha pra gente de cima abaixo e Diana sabe cuidar disso melhor que todos. É o amor que clareia esse defeito. Problema delas. Não temos que nos meter.
IGNACIO - Essa mina é louca… Já te disse, você não acredita.
DIEGO - Bem, assim são as mulheres. Um dia dizem que sim, outro não. Um dia estão felizes, em outro raivosas. Um dia querem cachorro, no dia seguinte querem gato. Por isso mesmo sou gay. (relaxado, deita-se na cama) A questão é que não abra a boca pro mundo, especialmente em frente a Susana, até que Diana a conte sobre a viagem. Ainda é um tema delicada pra ambas.
IGNACIO - Tá, Diego, entendo que Susana te ama e por isso se preste como barriga de aluguel, mas ainda parece algo muito forte depois saber que após o nascimento, terá que ficar a milhas de quilômetros de distância do bebê que pariu… Aliás, pra onde elas vão?
DIEGO - Uruguai, apenas, sem exageros.
IGNACIO - Ok, Diego, mas é possível que as coisas mudem durante o processo de gravidez e elas peguem carinho à criança e depois tenhamos problemas por ele. E se não chegam a viajar? E se for cancelado o emprego de ouro?
DIEGO - Não, bobo. Não vai acontecer. Você tá sempre pessimista, louco. Agora que temos o que queremos, você põe problemas. (faz expressão de enjoado) E aliás, Diana não vai querer estragar tudo (ri) Adoro sua inocência, bobinho. Fique tranquilo, homem. A única coisa que cê deve fazer é ter cuidado pra não tocar no assunto na frente delas porque é algo novo ainda.
IGNACIO - Hum… Puxa…
DIEGO - Veja, bebê…
Diego pega Ignacio pelos braços e o deita sobre a cama, olhando fixamente em seus olhos.
DIEGO - Cê acha que eu poderia brincar com algo tão sério como isso? E, além disso, com você? Nunca, amor! Se localiza no GPS, por favor!
Ignacio pensa por alguns segundos, crendo impossível que Diego brinque com isso, sorrindo um pouco, apaixonado, e recebe vários beijos do sorridente Diego.
DIEGO - Eu prometi a você que se algum dia eu fosse trazer um bebê ao mundo seria somente se você estivesse ao meu lado pra criar e assim aprendermos a ser os melhores pais e solidificar nosso laço. Ainda mais agora, que cê sabe o que vai acontecer com o coroa. De certa forma, nosso filho chegaria pra preencher um grande vazio…
IGNACIO - Você sabe que é homem da minha vida. Eu larguei tudo por você, Diego… Mas tenho que ser sincero; ainda fico louco em saber que a louca histérica vai ser barriga de aluguel.
DIEGO - Bem, gatinho, mas é nossa única opção. É o mais barato, conhecido e confiável que temos. É a única maneira que podemos alcançar a simbiose.
IGNACIO - Sim, você tem razão.
DIEGO - E se prepare pra mudar fraldas, dormir menos à noite e fazer mamadeiras, porque vamos cumprir nosso sonho, Ignacio… Vamos ser pais de um pequeno rockstar!
Ignacio, mais convencido, sorri, iludido. Seu rosto se põe de melhor aparência, acostando-se em DIego para abraçá-lo fortemente.
IGNACIO (tom baixo) - Diego… (pausa) Diego, você me ama, né? Me ama ou só me deixa viver aqui por pena, porque sabe que não tenho pra onde ir?
DIEGO - Como tem coragem de me perguntar isso, maluco? Claro que te amo, bobinho! Vamos ter um filho, ambos… Isso não é uma prova real do meu amor? Te amo mais que nada no mundo! (surpreso e um pouco cabisbaixo, se aproxima dele, olha-o fixamente nos olhos e lhe dá um selinho) Tudo o que eu faço, nunca foi por amor próprio, sempre foi pelas pessoas que eu amo! Eu te amo! Olha pra mim e lembre-se… Eu te amo e tudo, absolutamente tudo o que faço, é pra corresponder esse sentimento (pega a mão de Ignacio e põe em seu peito).

CENA 02. CASA DE RODRIGO - SALA DE ESTAR - INT. - 16:37.
Sério, com sua postura e olhar firmes, o homem de braços fortes e cabelo despenteado, larga a cintura de Diego. Este, cansado e agitado, cai na poltrona, tentando acalmar sua respiração acelerada em meio a um sorriso inapagável.
O homem de corpo trabalhado, quase indiferente a tudo, se dirige ao banheiro. Segundos depois, volta.
HOMEM - Última vez que te recebo aqui, garoto. Não gostaria que os outros saibam que fiz isso por uma grana e cheguem a pensar que tenho meus clientes preferidos, entendeu?
DIEGO - E não sou seu preferido, Rodrigo? (veste-se, sorrindo maliciosamente)
RODRIGO - Não.
Um grande silêncio se pôs no ar. O gigolô se encaminha, vestindo uma boxer, até a cozinha, sempre indiferente.
RODRIGO - E ainda continua aqui? O serviço acabou. Bye! Vaza!
DIEGO - Você sempre grosso…
RODRIGO - O quê? Quer que eu te faça carinho? Quer que eu conte uma historinha? Ou por acaso quer um segundo tempo? (toma um iogurte) Obviamente que não pois, não dá mais e cê sabe que sou coisa séria. Não tenho vontade de ser incriminado. Sou muito gostoso pra ir pra cadeia. (ri) Então, voa daqui, passarinho. Vai pra casa que seu namoradinho deve estar te esperando com a comidinha pra te dar na boca.
DIEGO - Ai…
RODRIGO - E se se incomoda como eu sou, por que vem tão frequentemente me visitar? Cê gosta? Cê gosta de mim, completinho? Porque, claro, é óbvio que meu sexo lhe enlouquece e produz vício em você. (enojado e sexy, encara Diego) Não é problema meu se seu namoradinho não pode lhe entregar o mesmo nível de satisfação que eu dou pra você.
DIEGO - Por que cê é assim? (o olha, encantado, mas chateado)
RODRIGO - Como assim? Gostoso? Irresistível?
DIEGO - Grosso, frio, soberbo. (levanta-se e aproxima-se dele) Cê não pode ser um pouquinho mais de boa com seu melhor cliente?
RODRIGO - Não. Não gosto dos filhinhos de papai (severo) Gosto dos homens feitos e direitos, independentes, realizados. Não curto os dentro do armário, que são os piores. Não curto os pentelhos ‘calientes’, como você, que se mostram verdadeiros anjos com cheiro a leite mas no momento que ninguém vê, esse mesmo leite é todinho tomado, e pedem mais e mais… Agora tira essa bunda passiva daqui e vai chorar seus problemas pro seu ‘papito’, namorado, namorada, cachorro ou o que seja! Bye, tenho que arrumar essa casa!
DIEGO - Rodrigo…
RODRIGO - EU DISSE “BYE”, SURDO DE MERDA!
DIEGO - Cuida como cê fala comigo!
RODRIGO - Te dou um conselho, cachorrinho… Cê tem 26 anos, é profissional, tem grana. Pode fazer e desfazer sua vida como der na telha; meter com quem quiser, onde, por onde e quando quiser, sem andar escondido como um rato de esgoto. Cê é adulto. Garanto que indo pra longe daqui, longe de seu pai, vão acabar seus problemas e sequer terá de gastar o dinheiro comigo.
Diego se mantém em silêncio, franzindo a testa, olhando o cabelo despenteado do gigolô, os olhos verdes de gato e essa atitude desinteressada que o deixa louco. Rodrigo nem sequer olha olha a Diego, enquanto faz tarefas na cozinha. Diego, finalmente, pega sua mochila e entrega umas cédulas de reais a Rodrigo antes de ir.
RODRIGO - Ei! (enquanto conta o dinheiro) Espera…
DIEGO - Quê?
RODRIGO - Faltam 25 reais.
DIEGO - O quê?!
RODRIGO - Cê acha que eu dou conselhos grátis a qualquer um assim? Não, gatinho. ‘Vamo’ se ligar.
DIEGO - Imbecil. (bate a porta)
Rodrigo dá uma gargalhada e volta a tomar seu iogurte, arrumando umas caixas que enchia com pertences.

CENA 03. CLÍNICA ELQUI - SALA DE ESPERA - INT. - 10:32.
Legenda: DUAS SEMANA DEPOIS.
Diana e Susana estão sentadas em um sofá, sozinhas e de abrigo, devido ao frio, esperando a chegada de Diego. De longe, a secretária olha de vez em quando pra elas, deixando sua revista de lado mas sem largar seus biscoitos de chocolate.
DIANA - Nervosa, bebê? Porque eu não consigo controlar o Parkinson nas minhas pernas desde a noite. Não posso tomar nem um café que me derramo toda.
SUSANA - Ai, gatinha, essa deveria ser eu (ri) Qualquer um diria que você é que vai receber o esperma. Eu estou mega ansiosa… Ai, olha, aí vem o Diego (sorri, levanta-se, mas logo fecha a cara e senta-se novamente, cruzando os braços) Ai, mas vem com esse babaca insuportável, borboleta asquerosa, fedendo a leite… Ui, me enoja.
DIANA - Susana, não quero que se incomode agora, tá? Segura a vontade de dizer qualquer palavrinha nesse momento, porque agora nada deve sair mal. Relaxa os óvulos.
Diana levanta-se para cumprimentar Diego, enquanto Susana e Ignacio se trocavam duros e sérios olhares.
SUSANA (tom baixo) - Perdeu algo, fedelho asqueroso?
IGNACIO - Perdão? (segurando um copinho de café) Não tem nada pra comer, por acaso? Alguma coisa pra ocupar essa boca, ao invés de ficar falando merda?
SUSANA - Tudo o que não tenha passado pelas suas mãos ou a meio metro de ti, é comível.
IGNACIO - Pena que muitos não podem dizer o mesmo sobre você. (ri, dando meia volta)
SUSANA - Idiota…
IGNACIO - Doida.
SUSANA - Viado!
IGNACIO - Caminhoneira passiva três quartos…!
A secretária, ao fundo, boquiaberta, deixa cair o chiclete que estava mastigando.
DIANA - Chega com essa merda! Calem a boca, ou vou injetar silicone no focinho dos dois!
DIEGO (sério) - Diana agora vai me acompanhar pra assinar uns papéis e vocês vão esperar aqui, tranquilos, calmos, caso o doutor chame, ok? (pausa) Eu sei que vocês têm uma espécie de magnetismo com cargas iguais mas, por favor, já são suficientemente maduros pra se controlarem…
DIANA - O conselho de ética do dia! (irônica, ri)
DIEGO - Não começa cê também.
Eles viram-se e seguem andando. Susana e Ignacio mantêm-se parados, mas distantes. O silêncio dura pouco e, no primeiro momento que seus olhares se cruzam, Susana, explosiva, quebra o gelo.
SUSANA - Quê?
Ignacio não responde e apenas sorri indiferentemente, que deixa Susana ainda mais irritada.
SUSANA - Ria! Ria! Dê gargalhadas! Te afoga na diversão! Ri o quanto quiser! Tenho certeza que cê tá ao lado do Dieguinho por interesse, porque você é um pobre mendigo que ficou na rua e se aproveitou do melhor que encontrou. Mesmo que ninguém acredite em mim, eu vou mostrar isso, seja como for!
IGNACIO - O quê cê tá falando? Chega, Susana. Não quero brigar. Tá muito cedo.
SUSANA - Cê tá com o Diego só pelo seu dinheiro, porque sabe que ao futuro finado Seu Gê resta pouco tempo de vida… Por isso quer tanto ter um filho com ele, pra depois poder mostrar as garras e PÁ, prender ele ao acordo de união civil. Promete a ele uma família, felicidade, amor eterno…! Rata asquerosa!
IGNACIO - Você é venenosa, Susana. Como você pode inventar algo assim, serpente? Mesmo que não me suporte, não pode me caluniar de tal maneira… Não sei de onde sai essa má onda sua, louca. Pare o show, por favor. Você ama fazer o ridículo e sai apenas como uma doida.
SUSANA - Você é uma pobre mosca morta, Ignacio. Assume. Está há anos com Diego só pra ter onde comer e dormir sem fazer nenhum esforço pra dar esse cu passivo.
IGNACIO - Maluca! Não se mete na minha vida que eu não me meto na sua, ok?
SUSANA - Mas, olha, cachorrinho… (olha-o dos pés a cabeça) Olha pra si mesmo e me responde: quem vai aguentar viver anos numa mentira onde você é apenas uma sombra, sem cair no desespero ou no tédio? Óbvio que um asqueroso que quer tirar proveito da situação.
IGNACIO (raivoso) - Isso não tá certo! (com lágrimas nos olhos) Você… Você tá dizendo tudo isso por raiva, por inveja, porque sabe perfeitamente que nunca poderá criar um filho como Deus manda! Poderá ter dentro de você, sentir crescer dentro de você, mas jamais saberá o que é um sentimento de mãe, porque está podre por dentro.
SUSANA - Parece que tá lhe fazendo mal ver tanta novela às tardes, querido (ri) Assuma, machinho frustrado, assume que você tá ardendo por dentro porque poderei cumprir o desejo de ser mãe antes de você.
IGNACIO - Cê tá tão certa disso? (sorri, convencido)
SUSANA - Tão certa quanto que você é um cachorro abandonado pela sua família, além de um falso menino de bem (sorrindo, o lança um beijo, vendo mais de longe Diego chamando-a)

CENA 04. CLÍNICA ELQUI - CONSULTÓRIO MÉDICO - INT. - 11:16.
Diego e Susana estão sentados em frente ao Doutor Pencil, pegando a mão um do outro. O Doutor se encontra realizando perguntas e ambos com um sorriso nervoso no rosto.
DR. PENCIL - Isso não é qualquer coisa… Não, não, não! (golpea a mesa, fazendo os dois pularem de susto) É um filho! Um filho requer muita responsabilidade, muito cuidado, muito respeito e carinho! Sim ou não? Sim ou não?
DIEGO - Claro que…
DR. PENCIL - Exato! (pega umas pastas) Seus exames saíram excelentes. Ambos estão aptos para esta intervenção. Já fizeram o cheque, certo? (sorri)
DIEGO - Sim.
DR. PENCIL - O ‘muchacho’ está completamente pronto para a intervenção, que é ambulatória. Em mais umas horas, tudo estará realizado. E você, senhora, lhe extrairemos alguns óvulos, para que sejam fecundados pelo seu marido. Logo, novamente introduziremos ao seu útero para terminar o processo. Tal como havíamos conversado anteriormente.
Susana, mais relaxada e sorridente que o nervoso Diego, se põe de pé e sai da sala.
Agora o médico sozinho com Diego, pega duas revistas de uma gaveta de sua mesa.
DR. PENCIL - Escolha, Diego. (mostra uma revista voltada ao público gay e outra ao heterossexual) As gatinhas perversas da meia-noite ou os militares agoniados pela solidão?
Diego, envergonhado, fica sem saber o que fazer. O médico ri e entrega uma revista ao público bissexual.
DR. PENCIL - Adoro fazer isso e ver a cara dos meus pacientes. (volta a rir e lhe entrega uma vasilha) Agora, vai, tranque-se nesse quarto, recorde os bons tempos de adolescente, cheios de solidão junto a ela.

CENA 05. RESTAURANTE - EXT. - 15:10
Diego sorrindo, relaxado. Frente a ele, está Ignacio, expressando confusão e com um nó na garganta. Por debaixo da mesa, Diego pega a mão de Ignacio.
DIEGO - O que houve, gatinho? Você tá muito calado desde que saímos da clínica. Se for por fome, te entendo, mas depois da bebida sempre vem a comida. Ou não é por isso?
IGNACIO - Diego… (acomoda sua cadeira e aproxima-se de Diego, triste) Você se incomoda com eu viver em sua casa e não dar suporte com nada? Precisa que eu trabalhe? Porque se sim, tem que me dizer e eu imediatamente arrumo alguma coisa… Não quero parecer um estorvo, nem nada disso.
DIEGO - De novo isso. (chateado) Aposto que foi Susana que meteu essas coisas outra vez na sua cabeça. O que a gente já tinha conversado, ãhn? (olha para todos os lados e dá um rápido beijo em Ignacio) Mas você é bobinho… Se sabe que não é assim, pra quê fazer isso?
IGNACIO - Mas eu queria saber sua opinião, nada mais (sorri, tranquilo) Mas há algo que me chamou atenção…
DIEGO - O que houve? (assustado)
IGNACIO - Na clínica, a histérica me falou com muita segurança sobre o filho que terá com ela… Como se estivesse completamente segura de que ela o criará junto a Diana. E supõe-se que…
DIEGO - Supõe-se que Diana ainda não falou com ela sobre tudo. Eu disse pra não tocar no assunto, né?
IGNACIO - Como não a contou?!
DIEGO - Bobinho, óbvio que sabe. Susana faz esse joguinho pra unicamente chatear você. Te trola lindamente e você cai como um patinho. Já disse pra não tocar no assunto.
IGNACIO - Não. Eu não falei nada. Tive muita vontade de esfregar na cara dela nossa paternidade em algum momento, mas não fiz. Pô, Diego, entenda que tudo é complexo pra mim. Mas enfim, você tem razão.
DIEGO - Amor… (calmo) Anote isso… Quando Susana souber da surpresinha que Diana tem, vai se esquecer de tudo, acredite. Cê sabe que ela ama o luxo. Além de que se há algum problema, vai se resolver. E também quando nascer a criança, não nos isolaremos delas para que não o vejam nunca mais. Não… Mas tem de deixar bem claro como serão as coisas. Aliás, existe Skype… ou não se lembra do quanto a Internet nos ajuda?
Ignacio sorri, apaixonado. Ambos ficaram em silêncio por um tempo, sem deixarem de se olhar.
IGNACIO - Ok. Só me prometa que depois de realizado o casamento as coisas não mudarão entre nós.
DIEGO - Claro que não vão mudar, meu gatinho gostoso. (sorri e aperta as mãos dele por baixo da mesa) Pelo contrário, melhorarão em cem por cento. Prometo.

CENA 06. CASA DE GERMANO - QUARTO DE DIEGO - INT. - 17:15.
Legenda: TRÊS SEMANAS DEPOIS…
Diana se encontra com um grande vestido de noiva. Seu rosto delata um ar de tédio. Ao seu lado, a entusiasmada Susana, vestida formalmente, trata de animar a companheira enquanto ajeita os últimos detalhes de seu look.
SUSANA - Mude essa carinha, minha vida. E faça combinar esses dentes brancos com esse vestido. (ajuda Diana com o penteado) Hoje é o grande dia! Em algumas horas nosso contrato tomará vigência e estaremos esperando nossos frutos. O dia de hoje, maravilhoso sábado, começa uma nova etapa das nossas vidas!
DIANA - Se eu não tivesse com esse vestido e alguém entrasse no quarto, acredite, pensaria que é você a noiva deste casamento (ri alto) Você tá certa de que isso não te incomoda? Ainda dá tempo de…
SUSANA - Eu te amo, Diana (pegando sua mão e levando até a barriga) Você não tá sozinha nisso. Nós duas somos parte desse jogo. É por pouco tempo e ajudará a todos. É uma loucura gostosa até.
Ambas, solitárias no silêncio, sentem a respiração cada vez mais agitada a medida que aproximam seu lábios, porém o momento é interrompido pelo som da porta batendo.
Melina, empregada doméstica, levanta as sobrancelhas e não emite nenhuma palavra, enquanto elas se separam.
Um agudo grito rompe o tenso momento quando Germano entra, contente e radiante, e vê a noiva.
DIANA - O que houve, seu Germano? (assustada) Ainda não estou pronta, mas…
GERMANO - Está radiante! Me encanta! Tudo está lindo! Este dia foi feito especialmente para as boas notícias! Me encanta! Me fascina como o Sol!
SUSANA - A que se refere, seu Gê? O senhor está notavelmente alegre com o dia de hoje!
GERMANO - É que você não sabe o quanto esperei pelo dia de hoje, amiga da minha nora. E minha Virginia, que descanse em paz, acaba de me surpreender com um presente incrível lá do alto.
SUSANA - Lhe prolongou a vida, seu Gê?
GERMANO - Em breve saberás, Susan. (logo, dirige-se a Diana) O juíz acaba de chegar ao nosso pátio. Está pronta, querida nora?
Diana, tentando não mostrar incomodidade, finge um sorriso radiante e pega Germano pelo braço e logo saem pela porta.
Susana e Melina, mais atrás, cruzaram tensos olhares por uns segundos.

CENA 07. CASA DE GERMANO - PÁTIO - EXT. - 17:30.
O pequeno pátio da casa encontra-se completamente decorado para a ocasião: laços de seda cor pastel, um improvisado altar, umas quantas cadeiras simetricamente bem organizadas e um impecável bolo ao fundo. Os poucos convidados conversam e andam, aguardando o início da cerimônia, enquanto que Ignacio e Diego, impecavelmente vestidos, conversam longe de todos.
IGNACIO - Seu pai não suspeitou nada até agora? Não houve problemas?
DIEGO - Me perguntou algo que não tinha pensado antes. Me perguntou pela família de Diana.
IGNACIO - Ah, e o que você inventou?
DIEGO - Não me veio nada melhor em mente pra dizer e falei que tinham se inundado, mas não lembrava que antes havia comentado que eles moravam em Calama, em pleno deserto de Atacama.
IGNACIO - Essas coisas só acontecem com você, Diego.
DIEGO - Tive que contornar a situação, dizendo que o inverno boliviano tinha se adiantado, então não pegue as notícias de hoje, por favor. O pobre tinha tanta vontade de conhecê-los. Até um “Germano ajuda os sogros do filho” ele queria fazer, organizando rifa e bingo pra ajudar.
Logo, Diego vira-se ao escutar aplausos entre seus convidados e vê-los sentando-se. Ao fundo, vê Diana, radiante e de branco, que está ao lado de seu orgulhoso pai. Um sorriso sincero nasce em seu rosto e as batidas de seu coração aceleram de acordo com a emoção que está sentindo.
Ao chegar em frente ao altar, Germano lhe dá um caloroso e forte abraço, que o faz sentir muita culpa. Diana, se coloca ao lado de Diego.
DIEGO - Você tá muito linda. (sorridente) E estou muito nervoso…
DIANA - Ridículo. (vai até o ouvido de Diego) Não faz o hétero, porque fica péssimo.
DIEGO - Mas tô nervoso de verdade.
DIANA - Bem, mete os nervos onde você tanto gosta e acelera esse show porque esse vestido e esses sapatos tão me matando.
Ambos sorridentes, agora olham ao falso juíz que subia ao altar.
JUÍZ - Bem… Olá a todos. (levanta sua mão direita, e deixa a vista sua inexperiência) Este… Eu sou Marco Ibaceta e sou o juíz deste casamento para que todos saibam.
DIANA (sussurra) - Diego, cê não podia conseguir alguém que no mínimo tivesse um pouquinho mais de delicadeza com a farsa? (ao ouvido de Diego)
DIEGO (sussurra) - Bem, foi o máximo que eu consegui. Me foi tudo na questão da inseminação.
JUÍZ - Estamos aqui… para unir em casam… casamento, seu Diego Souper e… Joana…  (lia com grande dificuldade, rindo um pouco, mas fingindo classe)
DIANA - Diana.
O falso juiz tem um ataque de riso.
DIANA - Diana Melgarejo.
JUIZ - Diana Melgarejo (tentando se recompor) Sabem o quê? Vamos fazer isso modernamente, jovem e aloucadamente, e vamos pôr o turbo nitro na questão da fome, ok?
Diana, envergonhada, baixa o olhar e respira fundo. Os convidados riem levianamente com o humor do falso juiz. Diego, muito nervoso, trata de manter a felicidade em seu rosto.
JUIZ - Que se aproximem os padrinhos e assinem isso aqui. (pegando um livro e procurando uma caneta em seu bolso, de onde tira um cigarro de maconha e um isqueiro, para finalmenete encontrar a caneta) E depois o casal faz o mesmo.
Quando Diego se aproxima, fala ao falso juiz, entre dentes:
DIEGO - Que merda é essa? Por acaso não te dei o roteiro nesse livro? Tá tudo péssimo.
JUIZ - Puta merda, é que eu não consigo ler, mano, e esqueci de ensaiar.
Diego volta a seu lugar.
JUIZ - Bem, se ninguém se opõe, pelo sinal da Santa Cruz, de nossos inimigos livra-nos, senhor Deus nosso. Pá pá (realiza um movimento com as mãos e conclui)
Todos aplaudem fortemente logo de realizado o ato, especialmente quando Diana e Diego se beijam. Ignacio, baixa o olhar por uns instantes, tentando controlar o ciúme, apesar de saber que tudo se trata de uma farsa.
Germano, completamente emocionado, em lágrimas, se aproxima de seu filho para dar um forte abraço.
GERMANO - Te amo, filho. Te amo tanto. Não sabe o quão feliz eu estou com isso. É um orgulho ter você como filho, campeão.
Diego sente culpa. Ignacio se aproxima para felicitá-lo.
IGNACIO - Feliz?
Diego não responde mais que com um culpado sorriso, e logo abaixa o rosto, até que veem seus amigos o felicitar.
Logo, ouve-se um barulho de taças e vê-se Germano sustentando uma em uma de suas mãos e todos põem atenção nele.
GERMANO - Festa! Festa! Quero que todos passem para a minha sala para que sigamos com a celebração e assim dar uma grande surpresa ao meu filho e sua nova esposa! Longa vida a esta nova família!
Todos emitem um sonoro: “Longa vida!”

CENA 08. CASA DE GERMANO - SALA - INT. - 18:30.
Todos com o olhar sobre Germano, que acaba de entregar seu presente ao casal.
DIEGO - O que é isso, coroa?
GERMANO - Abra, campeão, é o seu primeiro presente.
Intrigado, Diego abre o embrulho e encontra umas chaves. Estranhando, olha a seu pai.
DIEGO - Chaves?
GERMANO - É sua nova casa, campeão. (o abraça) É o mínimo que você e Diana merecem. Mais ainda a família vai crescer.
Diana, Ignacio, Susana e todos os presentes, surpresos, ficam sem palavras e aplaudem por tal ato de generosidade.
DIEGO - Mas, coroa, eu… (em choque)
GERMANO - Mas isso não é tudo! (sorridente) Porque um não é nada, eu tenho outro presente pra todos vocês, mas dedicado especialmente ao meu filho que me rouba o coração.
Intrigados, todos observam. Um grande silêncio se põe no lugar, enquanto Germano pegava uma pasta, a qual entrega a Diego, que começa a ler, ficando impactado com a notícia. Diego, com respiração acelerada e sem poder falar, olha-o lentamente.
GERMANO - Sim, filho. Como você acabou de ler (olhos cheios de lágrima) Minha Virgínia que está no céu também enviou um presente a mim e me deu uns bons anos mais de vida junto a ti.
DIANA - Como?!
GERMANO - Isso mesmo que escutou, querida nora. Refiz os exames e os resultados, milagrosamente, saíram excelentes. Eu não vou mais morrer, queridos. Agora poderei desfrutar do meu filho por muito mais tempo e também do meu futuro neto. Há algo mais incrível que isso?
Os convidados ficam alegres com a notícia, enquanto Diana, Diego, Susana e Ignacio ficam em completo estado de choque.

FADE OUT.

CONTINUA...

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